Tudo começa com uma aposta entre a raposa e o texugo. Eles queriam que o monge abandonasse o templo, para que um dos dois pudesse reivindicar a posse do local. Mas o monge permanece inabalável. E a raposa se apaixona por ele. Em Kyoto, o mestre de yin-yang não é feliz. Ele possui tudo, mas tem medo. E fará de tudo para usurpar a vida e a paz pertencentes ao monge. A raposa descobre seus planos e toma o triste destino do monge para si. 

A fábula é singela, mas carregada de pura poesia. Quem já leu Stardust (um dos meus romances ilustrados preferidos, logo mais aqui), sabe do que Neil Gaiman é capaz. Ele reconta uma bela lenda japonesa e a insere no universo de seu Sandman. Além disso, a obra é um deleite visual. Yoshitaka Amano – aqui em sua única incursão no universo dos quadrinhos – é um gênio. As cores de suas ilustrações (ah, a Lua) nos transportam, literalmente, para o Sonhar. 

É a história de um amor não consumado, que exige renúncia e coragem. A raposa é uma personagem fenomenal. Bela, determinada, vingativa. Quando Morpheus lhe explica as dificuldades que enfrentará para capturar os Baku, os Devoradores de Sonhos, ela responde: “Eu também sou uma fera astuta”. E completa: “E eu morreria por ele”. 

“Então capture os sonhos dele, criança”, devolve Sandman, na forma de uma raposa negra gigante, com a ponta da cauda branca. O monge, por sua vez, decide retribuir o gesto da raposa e, diante de Morpheus, exige o seu sonho de volta. A raposa e o monge, que em vida não puderam vivenciar o amor plenamente, têm apenas um momento para se despedir. Fugaz. Mas eu acredito naqueles que viram duas figuras caminhando juntas à distância, no local onde pastam os Baku. Eu sempre acreditarei no final feliz dos amantes. Quase chorei no final da narrativa, e agora aqui estou novamente. Lindo. Lindo. Mil vezes lindo.