Livro do dia: O vento nos salgueiros

Livro do dia: O vento nos salgueiros

Posted by Kátia

Dia das Crianças é dia de muita brincadeira, sim senhor. Tem que ter piquenique, abraço de árvore, leitura ao ar livre, teatro de boneco, show de música e mágica, pintura de rosto, exposição de brinquedos, contação de histórias e tudo mais que o tempo permitir. E que o dia seja lindo para que possamos todos nos deleitar (e deitar na grama, porque esse livro pede para ser lido sob o sol) com a leitura deste presente especial. O Vento nos Salgueiros é um clássico imortal, e nas palavras da grande Ana Maria Machado – consultora editorial e fã número um do título – um livro inesquecível. Concordo totalmente com ela. 

O Vento nos Salgueiros foi publicado em 1908 pelo inglês Kenneth Grahame. A atemporal história de amizade e amor à natureza surgiu como uma série de aventuras para ninar o pequeno Alastair, filho de Grahame (e aqui é inevitável que eu me recorde com muito amor das histórias do ursinho Pooh, que o adorável A. A. Milne dedicou a seu filhote Christopher Robin. Aliás, Milne era tão apaixonado por O Vento nos Salgueiros que até adaptou a obra para o teatro, em 1929. Com o título Toad of Toad Hall, a peça é focada nas aventuras do Senhor Sapo). Ora divertidíssima, ora emocionante, essa ode ao verde lar segue os passos de quatro amigos muuuuuito diferentes: o Toupeira, ingênuo e gentil, facilmente impressionável no princípio, mas que cresce e torna-se um líder admirável; o Rato-D’Água, uma alma de poeta, defensor ferrenho de sua amada terra, tão apegado ao rio quanto aos amigos; o Sapo, sujeito hilário e vaidoso, sempre em busca de novas formas de diversão; e o Texugo, um tipo anti-social, sincero ao extremo, mas que guarda um grande coração no peito.

Acompanhamos então o despertar do Toupeira, que decide interromper a faxina de primavera em sua toca e aproveitar o sol que brilha lá em cima. Com os raios de sol a lhe aquecer o pelo, a brisa suave a lhe acariciar e o canto dos pássaros a lhe inspirar, o Toupeira sai numa caminhada sem rumo, sentindo-se como num sonho, até que se depara com um rio. Ele nunca tinha visto um rio na vida e aquele “bicho” ondulante, dado a murmúrios e rodopios, o fascina completamente. É aí que entra em cena o Rato, que não perde tempo e convida o amigo para um passeio de barco e um piquenique. Delícia! Ao final do dia, o Toupeira está conquistado: ele abandona a toca subterrânea e passa a viver na companhia do Rato. 

As estações do ano avançam, e as pequenas crônicas diárias ensinam muito ao nosso amigo Toupeira. Ele logo faz amizade com o Senhor Sapo e o visita na Mansão do Sapo, a morada mais incrível à beira do rio. É muito provável que este personagem torne-se o seu favorito: longe de ser o típico herói, o Sapo vive metido em confusões, devido ao seu espírito pouco prático e sedento de aventuras. Ele insiste em levar o Toupeira e o Rato numa viagem de carroça, mas que fique bem claro, não é uma carroça qualquer. Grandiloquente em seus hábitos, o Sapo manda construir uma carroça de morar amarelo-canário, com detalhes em verde e rodas vermelhas. O interior da carroça é impecável: camas, mesa, fogão, armários e uma despensa cheia de guloseimas. Contrariado, o Rato acaba cedendo aos apelos do inocente Toupeira. Mas é claro que o Sapo não demora para aprontar das suas. Na estrada, depois de um acidente causado por um automóvel, ele fica enlouquecido pelo “fon-fon” e só pensa em conseguir um veículo daquele para si próprio. Essa obsessão pela velocidade renderá momentos de tensão e o Sapo acabará amargando longos dias na prisão.

O esquivo Texugo dá o ar da graça no inverno, quando o ainda inexperiente Toupeira empreende uma jornada através da Mata Virgem com o intuito único de conhecer esse personagem singular. É certo que ele se perde na Mata e o leal Rato vem em seu auxílio. Depois de muitos apuros, os dois amigos são surpreendentemente bem recepcionados pelo Texugo, que se mostra um anfitrião perfeito. Para quem é conhecido por suas poucas palavras, o Texugo não consegue esconder o coração de ouro e inclusive resgata da neve dois ouricinhos perdidos (amo o Texugo, acho que ele é o meu preferido). O livro é justamente genial por delinear tão bem o caráter de cada um desses animaizinhos. Eles têm personalidade forte, pensam, sonham, lutam e até deliram, como o Sapo. Nesses dias memoráveis com o vento a balançar os salgueiros, o Toupeira revisitará a sua antiga casinha (preparem os lenços). E, ao lado do Rato, protagonizará uma das cenas mais idílicas da literatura: um encontro com o semideus Pã. Eu sinceramente não consegui conter a emoção. E se você está preocupado com o destino do esplêndido Sapo, não se preocupe: no melhor estilo Frodo de passar por provações e ainda ter que recuperar o seu lar, ele dará a volta por cima. Em grande estilo e com muita vantagem para contar. Isso se os seus sensatos amigos permitirem, claro. Esse é o que eu chamo de livro para toda a vida. Sente-se debaixo de um salgueiro (ou de um ipê, plátano, figueira, acácia) e aproveite a leitura. Feliz Dia das Crianças para todos nós!!! 

O vento nos salgueiros
Autor: Kenneth Grahame
Editora: Salamandra
Temas: Amizade; Natureza; Clássico
Faixa etária: A partir de 07 anos

Leia também: Temos o privilégio de ler O Vento nos Salgueiros em português por causa dela, a minha musa de infância Ana Maria Machado. Por isso, a dica de hoje é o também clássico Gente, Bicho, Planta: o Mundo me Encanta (Ed. Global). Através de contos preciosos, descobrimos a tênue linha que une todas as formas de vida no planeta. Criativo e brilhante, simples assim.

O flautista às portas da madrugada, ilustração de Paul Bransom para a edição de 1913
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