Hoje é um dia de saudade e melancolia, e não poderia escolher uma companhia melhor do que a de minha alma gêmea, o norueguês Jostein Gaarder. Eu sei que ele consegue ler o que vai fundo no meu coração, pois sempre versa sobre perda, de todas as formas possíveis. O sofrimento, no entanto, caminha ao lado da curiosidade: sobre o mundo no qual vivemos e aqueles tantos outros que desconhecemos, sobre nós mesmos, nossas essências, memórias e pensamentos.

Gaarder, aliás, tem uma bela galeria de personagens curiosos. Só para citar alguns, fico com Hans-Thomas, protagonista de meu livro favorito, O Dia do Curinga (leia mais aqui); a menina Sofia; os primos Berit e Nils do fabuloso A Biblioteca Mágica de Bibbi Boken (aqui); o fofíssimo Mika de Ei! Tem Alguém Aí?; e Joaquim, no melhor livro sobre o Natal de todos os tempos, Mistério de Natal (aqui). Nesta nova história, o garotinho não tem nome, mas isso não o impede de questionar tudo. Ele sai de casa na calada da noite, sozinho, e embrenha-se floresta adentro.

O menino está numa busca interior, porque ele sofreu uma perda irreparável. “Só existe vida no nosso planeta? Ou o universo inteiro está cheio de vida? Anjos e fantasmas existem? Será que alguém já se deparou com um ser mágico? O que é o tempo? Tudo o que já aconteceu desaparece para sempre”? Ele caminha até um tesouro escondido e o desenterra. Tudo ali lhe é muito familiar, o refúgio na árvore, os animais, a terra e o vento. Uma figura fantasmagórica (mas nada assustadora) o segue e aos poucos temos a possibilidade - e a honra - de conhecermos um pouquinho de sua história. Em maravilhosas ilustrações em preto-e-branco vislumbramos a sua alegria pregressa. Há um mágico, um cachorrinho branco, um barquinho veloz, uma leitura deliciosa à beira-mar. E o mais importante: há uma outra criança, uma presença luminosa que nunca, jamais poderá ser substituída.

Sem entregar muito o desenrolar da trama (e já com lágrimas nos olhos e o coração partido), digo que, ao contrário dos demais livros do mestre, aqui é impossível dissociar seu texto das ilustrações impressionantes do artista turco-norueguês Akin Düzakin. A perfeição começa na capa: o garoto, sentado entre o cão e o caderno de recordações, sopra um dente-de-leão e contempla o infinito. Mais bucólico, impossível. Se você, assim como eu, não tem vergonha de chorar suas perdas e recordar com todos os sentidos do corpo, esse livro foi feito para você. Obrigada por você existir, Mr. Jostein Gaarder!