Livro do dia: Clarissa

Livro do dia: Clarissa

Posted by Kátia

Clarissa é, nas palavras do próprio autor – o meu favorito Erico Verissimo – a história de uma menina que amanhece para a vida. Escrito em 1933, o livro é o retrato de uma época de inocência, uma época na qual as garotas ansiavam a chegada dos 14 anos para terem licença de usar sapato de salto alto, viviam a suspirar por astros românticos do cinema, como Gary Cooper (lindo!) e ficavam coradas quando os rapazes faziam-lhe galanteios respeitosos, algo como tirar o chapéu e inclinar-se levemente. Definitivamente, a época na qual eu gostaria de ter vivido.

A menina Clarissa, prestes a completar os tais 14 anos, veio do interior para estudar na capital Porto Alegre e mora com tio Couto e tia Zina, uma mulher de fibra que comanda uma pensão. Clarissa convive também com tipos interessantes como o major reformado Pombo, o galanteador Nestor, a sonhadora Belinha e o melancólico Amaro, bancário que sonha ser músico – e tem como melhor amigo um busto de Beethoven. Entre as poucas crianças com as quais convive está o pobre Tonico, um menino de sete anos que foi atropelado por um bonde e passa os dias na cadeira de rodas a desejar ardentemente uma vida que nunca terá.

Um turbilhão de emoções invade o íntimo da garota. A contemplação das maravilhas da natureza e a vontade de voltar para a casa de fazenda, onde passaria os dias descalça, a afagar a querida vaca brasina. A chegada da adolescência e o desejo de ser cortejada por um rapaz. A revolta com as vicissitudes da vida, a barbaridade de constatar que os pintinhos alimentados de farelo irão terminar seus dias na mesa de jantar, assim como o menino deficiente nunca poderá ser um soldado e o músico triste nunca irá compor um noturno que alegre os moradores da pensão.

Assim, Clarissa passa seus dias, sempre a encantar-se com as glicínias roxas e a brincar sob os pessegueiros floridos. A vida pulsa em cada milímetro do corpo da garota de tez morena e longos cabelos pretos. Coisa linda de se ver. Aliás, foi exatamente assim que Erico Verissimo teve a ideia para a personagem e o livro: ao observar uma normalista de treze anos, a dançar sob os jacarandás floridos da velha Praça da Matriz de Porto Alegre. Inspirado e inspirador. Faça essa deliciosa viagem no tempo em que as crianças seguiam os palhaços mambembes aos gritos na rua:

“Hoje tem marmelada?”
“Tem, sim sinhô?”
“Sentadinho na bancada? Com a sua namorada?”
“É, sim sinhô!”
“O palhaço que é?”
“Ladrão de muié!!!”

Clarissa
Autor: Erico Verissimo
Editora: Companhia das Letras
Temas: Universo infantil; Família
Faixa etária: À partir de 12 anos

Assista também: Ambientado num Brasil que acaba de tornar-se uma república, Vida de Menina (idem, 1994) é narrado por uma adolescente que ainda tenta adaptar-se às mudanças físicas e psicológicas próprias de sua idade. Baseado no ótimo livro-diário de Helena Morley e com a adorável Ludmila Dayer no papel da menina Helena. 

Rosa Rosarum, fotografia de Mathilde Weil, 1901
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